O Cadernos dos Ossos
Uma das frases que me marcou em Caderno de ossos, da Julia Codo, aparece já perto do fim, quando a personagem diz: “Acho que com o tempo fui percebendo que a vida é assim defeituosa mesmo”. Entendo a frase como uma síntese do livro, do Brasil e das complexas relações humanas. Ao escavar os segredos de uma família, que carrega, em seu interior, o passado também do país, a história expõe os silenciamentos e ocultamentos que atravessam não só as histórias familiares, individuais, mas também a nossa história coletiva. É uma história sobre a história: sobre esquecimentos, buracos e vazios que nos constituem e que, ao mesmo tempo, ajudamos a constituir. Constituem enquanto individuo, filha, avó, sobrinha, e enquanto cidadã. Lidar com o que nos constitui também é reconhecer as inconsistências, os arranhões, as cicatrizes, as partes não tão bonitas que costumamos ocultar ou idealizar. É lidar com o fato de que pessoas próximas, que amamos, também cometem erros, que são defeituosas. Compreender as histórias e os defeitos que nos constituem, como já disse Clarice também, é um dos maiores desafios individuais e coletivos, pois os defeitos podem representar quem somos e alterá-los podem abrir caminhos para outros eu e país, e o novo é sempre mais assustador que o que conhecemos.